O último desencontro




A culpa de eu amanhecer dormente é da morte, de novo, que veio bater na minha porta.


Pra onde olho tem os amigos dela e estou sem espaço. Lá no meu quarto, a cama fria recebe em vez de mim, a angústia refestelada debaixo do cobertor. Na cozinha, pelo quintal, nos cantos mais miúdos, o silencio no vazio perene. Tem muitos assombros na minha casa e eu não sei mais chorar pra afastá-los. Agora, sou covardia em pessoa. Queria fechar em mim, estar somente pra mim, falar só pra mim. Mas não posso. Tenho que sair daqui e ir lá.

Ir presenciar a amargura da perda, dar de cara com o passado, refazer e desfazer histórias. Enterrar os segredos.

Sei que meu coração vai se partir em mil pedaços ao ver a dor do meu filho chorar sobre o corpo do pai. Um pai que meu menino sempre quis, que marcou muitos encontros e faltou a quase todos eles. Um pai imensamente esperado em muitos natais, muitos aniversários, em todas as suas conquistas. Um homem perdoado pelo que não foi e, mesmo assim, não soube viver isto.


No hospital pediu: “morre não, pai, fica aqui, vamos marcar um encontro de verdade e vê se desta vez você não me dá bolo”.

Mas ele se foi. Deu outro bolo. O último e o mais doloroso de todos.

6 comentários:

  1. Sandra12:19

    Minha irmã querida... que dizer numa hora dessas????
    Sinto muito pelo nosso querido João, e que Deus receba em seus braços o espirito de seu pai!!!!

    Grande beijo!!! e meus sentimentos!!!

    De sua irmã de BH,

    Sandra

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  2. Querida Valéria!
    Há momentos difíceis que a gente gostaria de não estar lá,mas não tem jeito. Dói, ter que passar por eles,mas chorar sozinho dói menos. Que bom que você e seu filho podem se abraçar, seja com o abraço mesmo, com um aperto de mãos, seja com o olhar..não estarão sozinhos.
    Um beijo carinhoso para você e cuide-se bem!
    Vera.

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  3. ...de repente o vento,sempre ele,se transforma em ventania.Um simples passo para um lado e podemos sair do torvelinho esvoaçante.Fazemos isso;então percebemos que ele sopra mais forte,não nos galhos das árvores, nem nos cabelos das pessoas que estão em volta,mas dentro de nós,como se dissesse:Te chamei pra brincar e você não pode ir embora até que eu permita; apenas eu posso ir e vir;e,enquanto você não aprender a brincar como eu quero,nunca te deixarei ver o que há por trás das nuvens,das chuvas,dos raios;do tempo;e,a tempestade ventania,
    sempre ela,se vai como veio,
    de repente...

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  4. Querida Val

    Nossa, nessa hora nao temos nem palavras para dizer, só peço a Deus que lhe der muita resignação e força para suportar tudo isso.
    Fique com Deus

    Bjs

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  5. Falar o quê? Ah, meus olhos estão úmidos...Força!

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  6. joana12:19

    Querida vera
    Muito triste sua historia...mas tudo na vida tem um final,mesmo que pelo meio haja um pedido de uma criança...algum dia ela vai entender isso,mas até lá deixemos viver com alegrias!
    Lindo! gostei
    beijnhos
    tem uma noite descansada e um lindo amnhecer
    joana

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